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Apaixonar-me por UBUD | BALI


O plano de uma viagem de 6 meses não pode nem deve estar feito ao detalhe. Se soubesse tudo o que iria acontecer nesta viagem deixaria de fazer sentido fazê-la. Não precisava de viver para contar.

Bali. Bali para mim significava praias paradisíacas e um destino muito popular na actualidade. Marquei voo para Bali, sem pensar muito bem no que seria, porque se tanta gente fala, deve ser bom. Um dia antes de aterrar em Denpasar comecei a pesquisar onde iria ficar as primeiras noites. Todos os locais interessantes pareciam ou a uma distância enorme de carro, ou com a necessidade de apanhar um barco. O meu voo chegava bem tarde e depois de Jakarta a última vontade que tinha era de me rever em mais um destino desinteressante. Mas, nada que meia hora de pesquisa não resolva. Ubud. Cerca de 35km do aeroporto, hostel com transfer incluído, uma vila famosa pelo filme "Comer, Orar e Amar" que toda a gente me disse para ver antes de entrar nesta viagem e eu assim o fiz. A ideia não me agradou particularmente, começo a perceber que quando é muito falado, o destino geralmente (já) não é assim tão fantástico. Mas, arrisquei.

Dia 1 | Treinar o "portunhol"

Aterrei no aeroporto de Denpasar já de noite. As pessoas mais calmas e a decoração do aeroporto repleto de coelhinhos da Páscoa animou-me. Agarro a minha mochila do tapete e sigo para a saída onde me espera um senhor dos seus 50 anos com um papel com o meu nome "Mariana Trigo". Ah, como sabe bem não ter de fazer nada. Não ter de ligar o cérebro depois de um voo para organizar tudo na minha mente de como vou do lugar A para B e depois C com horários e poupanças de moedas com câmbios estranhos. Entrei na carrinha, relaxei e deixei toda a sensação de insegurança de viajar sozinha para trás. Confesso que de vez em quando dava uma olhada no google maps só para ter a certeza que estávamos no caminho certo.

Chego ao hostel, um check in rápido, em 5 minutos conheço as 5 pessoas do meu quarto e integro-me no grupo para o passeio do dia seguinte, marcado para as 9h da manhã. Li algumas vezes que quando estamos a viajar há algum tempo é impossível não acontecer uma troca de horários. Achei que comigo ia ser diferente, não foi. Vejo as pessoas à minha volta a levantarem-se e olho para o telemóvel, 7h da manhã. Ainda faltam 2h para as 9h, "esta malta madruga mesmo" pensei eu na minha inocência. Quando o alarme tocou às 8h percebi. Jakarta e Bali ficam ambos na Indonésia, mas seguem um horário diferente, em Bali é mais 1h. Ups, dou um raspanete mental a mim própria e digo ao grupo para não esperar por mim, fui apanhada na roliça dos horários. A melhor opção é mesmo afogar as mágoas nas panquecas de banana do pequeno-almoço do hostel.

Pergunto a 2 raparigas onde é o restaurante e acabo por me juntar a elas. Às vezes a química dá-se assim, e quando acontece, resulta em horas e horas de conversa. Que foi o que fizemos, conversamos a manhã toda sobre as histórias de vida de cada uma. O porquê de viajar, o porquê sozinha, as experiências que tivemos e que esperamos ter. Falamos, ouvimos, partilhamos opiniões, conselhos, no final tranquilizamo-nos umas às outras. Acho que posso dizer que foi uma das manhãs mais bem passadas de toda a minha viagem. Particularmente porque faz-me sentir muito bem conseguir que pessoas que acabei de conhecer partilhem os seus medos comigo na tentativa de receber uma resposta. E quando consigo dar-lhes essa resposta e sentir que as ajudei a ficar mais fortes e a acreditar que no final vai tudo correr bem, é como se tivesse ganho a lotaria.

Saí do hotel por volta das 13h já, com a Raquel e o David, 2 pessoas que conheci em momentos diferentes e que acabaram por continuar a viagem em conjunto. Ambos espanhóis, ela das Canárias ele das Baleares. Claro que explorar qualquer sítio do mundo no meio de dois espanhóis me iria obrigar a treinar o portunhol. Despacito, lá fui relembrando o palavreado até ser premiado com um "Oh! Que hablas muy bien espanhol". No final do dia e já depois de uma aula a comparar vocabulário espanhol português inglês francês e italiano, fica o recuerdo do David a dizer "Gostava de falar português mas não falo um caralh*".

Fiquei feliz de os ter apresentado e de se terem dado tão bem. Terminamos o dia a comprar Hammocks para ambos, para começarem a sua viagem de 5 dias pelo norte da ilha de Bali de scooter. Ajudei no planeamento, despedimo-nos apenas com um boa noite e nunca mais nos vimos. As relações humanas durante uma viagem a solo são intensas e curtas, a melhor forma de se tornarem inesquecíveis.

Dia 2 | 150 Km de Scooter

São 7h da manhã e já estou a tomar o pequeno almoço. Quero arrancar cedo, para não conduzir na hora de maior calor e porque por aqui chove sempre no final da tarde e conduzir uma mota, nestas estradas, neste trânsito, e pela esquerda, é um desafio que quero completar sem mazelas.

Às 8h já estou a assinar o aluguer da scooter 125 cc e a confirmar que o mais importante, a buzina, funciona na perfeição. Depois de um " Drive slowly" da senhora da recepção, começo a descer a medo a descida demasiado íngreme do hostel até à estrada principal e lá me encaixo naquele trânsito caótico mas funcional característico da Ásia.

O plano estava traçado. A primeira paragem era um templo ali perto, seguido dos Rice Terrace's e chegar ao Lake Batur antes do meio dia. Almoçar por ali e seguir para as famosas cascatas de Tegenunga para terminar o dia no Museu Agung Rai a ver um show de dança tradicional balinesa.

Como nem tudo corre sempre como planeado, a primeira paragem foi logo bem atribulada. O GPS constantemente a perder o sinal, estacionei "perto" do que parecia ser o templo e fui perguntando aos locais que me iam dizendo "Walk 3 minutes", passando para um "Walk 10 minutes" até parar um scooter na rua e dizer-me "Too far, I can drive you there". Ora, na Ásia não há ajuda sem pagamento. Não querendo ser má ou desagradável mas em locais cuja principal fonte de sustento é o turismo, é extremamente difícil encontrar alguém que se ofereça para nos ajudar apenas por simpatia. Estiquei o meu radar do desenrasque e aceitei a boleia daquele desconhecido. Deixei o meu sexto sentido fluir e arrisquei na verdade. E correu bem. Conduzimos uns 7 minutos e lá me deixou no tempo, pedindo uma "tip" para o gasóleo, ao qual eu respondi que daria quando saísse do templo e assim foi. Esperou por mim e levou-me de volta à minha mota. No final a minha "tip" era tão baixa para ele que nem a aceitou. Sem timidez alguma disse-me "Give me 50 000". Ora, esse era o valor que tinha pago pelo aluguer da minha mota para o dia inteiro! Quem tudo quer, tudo perde. E lá foi aquele desconhecido à vida dele, meio chateado por não ter conseguido enrolar esta turista.

Depois da aventura do templo segui para os Rice Fields. Estacionei a mota mais atrás como me tinham dito para não pagar as fees ilegais que cobram aos turistas em todo o lado e comecei a explorar aqueles campos verdes, que aumentam em altura por camadas deliciosamente bem delineadas. Para subir ao topo é necessária um "donation" obrigatório. Não percebo como não lhe chamam simplesmente bilhete, até o valor está definido.

São 10h30, chegou o momento de me fazer à estrada para o caminho longo de 50 km até ao Lake Batur, junto ao vulcão. Depois de passar por estradas bem arranjadas, pequenas casas do estilo balinense com caixas de correio feitas em bamboo e sentir o vento a bater no corpo a despertar aquela sensação de liberdade que a condução de uma mota transmite, começa o desafio.

Páro num miradouro na beira da estrada e já consigo ver toda a dimensão do lago, meio nublado, com o quadro do vulcão Batur atrás. Lindíssimo e poderoso. Uns locais lá me tentam convencer a não descer de scooter com o argumento de que a estrada é carregada de curvas mas, não fico convencida e sigo caminho. Começo a descer as curvas contra curvas meia a medo, a cerrar os dentes de vez em quando a antecipar uma possibilidade de cumprir o histórico da família de deslizes de mota, mas vai correndo tudo bem, uma curva de cada vez. Estrada recheada de buracos, meia molhada da humidade que a floresta provoca e a ser reparada a cada 100 metros de distância. Não se vêm turistas de mota por aqui não, mas continuo. Depois de ultrapassado aquele medo miudinho começo a desfrutar e a perder a noção do tempo. Continuo e continuo por aquelas estradas fora, ultrapasso motas mais carregadas e deixo-me ser ultrapassada por carrinhas enquanto capto com o olhar toda aquela arquitectura diferente, os miúdos de farda a irem para a escola e já a conduzirem motas que eu ainda tenho medo de ter nas mãos e tento sentir e guardar para mim aquela sensação de descoberta pessoal provocada por tantos estímulos exteriores que vou tentando processar à velocidade da luz.

Quando páro e olho para o GPS, já caladinho há demasiado tempo, o meu destino ficava já a 30 KM para trás. Ah, às vezes sabe bem perdermo-nos.

Lá voltei a subir todas as curvas e contra-curvas, desta vez a reparar nos olhares surpreendidos dos locais e alguns "Hello" das crianças na rua e até das famílias de 4 montadas numa scooter onde há espaço para todos.

Depois de sentir o barulhinho da fome a começar na barriga, decido que está na hora de almoçar e páro por ali num sítio que parecia uma mistura de miradouro com venda de rua. Tiro algumas selfies com desconhecidos para recordar o que é sentir-me um animal num Zoo e procuro o que comer. Encontro o meu prato favorito, por um preço que adoro ainda mais. Por cerca de 1.5 euro tenho direito a um prato recheado de arroz, caril de galinha e vegetais. O chá, esse é oferta da casa.

Baterias recarregadas, um xixi naquilo que dizem ser uma casa de banho e estou pronta para voltar à estrada. O próximo destino, as famosas cascatas Tegenunga. Já gastei mais de meio depósito, naquele medo de não encontrar uma bomba de combustível no caminho páro numa barraquinha com garrafas de 1L de Petramina expostas e por 70 cêntimos ponho cada litro de combustível.

Depois de mais de 1h de estrada chego ao destino. Início da tarde, a melhor altura para uns mergulhos numa cascata de 8 metros de altura e descansar o corpo de tantos kms de alcatrão e terra batida. Mato o calor dentro daquela água bem fria e fico a apreciar o turismo que por ali vai passando. "Donation" aqui "donation" ali, decido pagar para ir ver o alto da cascata e valeu a pena. De onde vem, como corre até ao precipício, tive o prazer o ver os sítios mais recônditos onde a maioria dos turistas já não vão. Sem ferir susceptibilidades, as pessoas transformam os locais mais bonitos do mundo em ... nada.

Depois de tanto tempo a refrescar pelas cascatas confesso que a minha vontade era ir dormir, sentia-me mesmo relaxada. Mas ainda faltava um sítio do plano inicial e tudo estava a correr tão bem que não podia deixar escapar o último esforço.

Falaram-me do Museu Agung Rai por ter espectáculos de dança ao final do dia. Na verdade não vi qualquer espectáculo, talvez tenha ido no horário errado. Mas valeu muito a pena. Senti-me dentro do filme que tornou Ubud famosa. Um museu recheado de arquitectura balinesa, os telhados detalhados, lagos enormes, estátuas e estatuetas a decorar um jardim perfeitamente simétrico onde dentro do museu se encontrava um hotel e um restaurante para quem tiver os bolsos recheados. Aquele local transmitiu-me aquele sentimento de felicidade tranquila que se apodera de nós devagarinho e sem razão aparente e senti uma vontade enorme de enviar carinho aos meus. Assim fiz, um vídeo para a Nieves a desejar Feliz Aniversário, umas fotos para a família a mostrar que está tudo a correr bem, uma frase mais amorosa para o namorado e uma foto mais animada para as amigas.

Chego ao hostel, entrego as chaves da mota e dou um suspiro de alívio por ter corrido tudo bem. Conheço os novos colegas de quarto, vamos jantar todos juntos e partilhar quem somos naquele momento entre hambúgueres deliciosos e saladas para os mais contidos.

E assim termino um dia num país estranho com pessoas que não conhecia há 1 hora atrás, a sentir-me em casa e completa.

Fica com o vídeo dos meus momentos por UBUD em 3 minutos:


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